sexta-feira, 14 de maio de 2010

A regra e a exceção, e a exceção, e a exceção...

Sempre tive muita admiração por quem sabe interpretar regras, cumpri-las, e ainda adicionar valor ao processo do design transformando limitações em oportunidades. Mas, mais do que admirar quem cumpre regras, admiro quem as questiona. Fico sempre muito desiludido com a Grécia quando lá vou – e não estou a falar da dificuldade que têm em gerir a dívida pública; quem não a tem, hoje em dia? – porque a arquitetura e o planeamento urbano obedecem a um mar de leis que um grupo de técnicos burocratas inventou e que faz cumprir, transformando quase tudo o que está abaixo do PARTENON numa imensa mole de edifícios desenhados com régua, transferidor, índices de ocupação, rácios de volumetria e artigos legais, sem qualquer caráter nem qualidade.

(Curiosamente, porque a criatividade é como o azeite e tem sempre de vir ao de cima, os projetos de design de interior são admiráveis – as lojas em qualquer cidade grega têm uma qualidade que é difícil de encontrar em muitos outros países com menores dívidas públicas.

Lembro-me sempre da história da criatividade tropical que me contou um amigo motard, indignado porque, no Brasil, ninguém usava capacete, rolando de cabelos ao vento pelas marginais da praia. Explicaram-lhe que “no Brasil, tem lei que pega e lei que não pega…”)

Sendo a Itália também um país criativo e com forte inclinação para inventar leis e regras que, mais ou menos, se fazem cumprir, fiquei muito admirado quando me falaram da “lei da Madonnina”. A tradição diz que nenhum edifício em Milão poderá ultrapassar a altura da estátua dourada da Senhora da Assunção, esculpida por Giuseppe Perego, e colocada sobre a agulha mais alta da catedral de Milão. Sendo a cidade fortemente católica e plana, não é regra para desprezar. E assim foi, durante muitos anos – a lei, passada de boca em boca durante muito tempo, terá sido oficialmente escrita nos anos trinta do século XX. Nem a famosa Torre Branca no Parque Sempione nem a Torre Velasca, ícones da cidade, ultrapassaram os famosos cento e oito metros e meio da santa senhora.

No entanto, Giò Ponti e Nervi projetaram a famosa torre Pirelli – a tal que sobreviveu ao impacto de uma avioneta – no final dos anos 50 com uma altura de 127 metros mas, para não faltar ao respeito religioso da lei, mandaram fazer uma cópia da estátua, também revestida a ouro, e colocá-la no topo da torre — onde funciona a sede do governo regional da Lombardia. Cumpre-se assim a tradição e a lei, e alberga-se uma instituição.

Este ano, mantendo-se a regra, já que houve necessidade de construir novas instalações para o Governo da Lombardia, promoveu-se um concurso internacional — ganho por Pei Cobb Freed & Partners, em colaboração com os ateliers de Milão Caputo Partnership e Sistema Duemila – e promoveu-se novamente a Madonnina, em nova cópia dourada, a 161 metros de altura.

Assim, mantém-se a regra, eleva-se a exceção… vejam bem o exemplo, enquanto alcançarem!

MS

ver em www.pndesign.pt

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