terça-feira, 19 de maio de 2009

Sala

É uma sala simples, quatro paredes, um tecto, e um chão. O chão destaca-se, reverberante, como num desenho de Escher. Não fosse o chão, obra de marceneiros que já não há, a sala poderia estar num hospital antigo: janelas altas, paredes altas, radiadores de ferro dos Anos 40: tudo branco. Na parede voltada a sul, duas janelas – uma é de sacada— aquecem a sala, deixam entrar de manhã dois grandes rectângulos de luz que se projectam no chão e roubam a cor aos tacos de madeira. No lado oposto, um longo e preguiçoso sofá castanho convida a dormitar olhando o ocre ensolarado dos prédios em frente. Acima do sofá, Cargaleiro e Mário Rodrigues não se deixam tocar pela luz. Noutro canto da sala, Nadir Afonso e Pomar, também incólumes. Frente a uma terceira janela, uma estante baixa com uma televisão -- quase sempre desligada -- e a “aparelhagem”, de onde sai Debussy, com a luz clemente das quatro da tarde pelas costas. Já se ouve tilintar a frescura das caipirinhas no bar cubano da esquina, nesta sala quente de Maio.

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